Atrito e lubrificação em maquinismos tem grande impacto económico e ambiental
16 março 2022Artigo de Pedro Marques, Investigador do INEGI, especialista em
transmissões mecânicas por engrenagens
Atualmente é necessária uma mudança drástica do paradigma energético, quer ao nível do armazenamento, quer dos processos de transformação de energia, com vista à redução da emissão de gases de efeito estufa, nomeadamente o CO2.
No que à indústria e aos transportes diz respeito, esta transformação ou mudança de paradigma pode passar por inovações de fundo nos processos e métodos utilizados, assim como no tipo de fontes energéticas utilizadas. No entanto, um dos aspetos que é muitas vezes visto como secundário ou mesmo esquecido, é o da eficiência mecânica dos maquinismos que integram qualquer máquina ou meio de transporte.
Tendo em conta a quantidade de maquinismos que existem nos meios industriais, assim como nos transportes e até mesmo na geração elétrica, torna-se necessário otimizar esses equipamentos no sentido da eficiência e fiabilidade máximas.
Ganhos diretos do aumento da eficiência de maquinismos são enormes
Na indústria da energia eólica, por exemplo, o produto final é a energia elétrica produzida, e por isso cada kWh de energia que é produzido conta. Muitos dos aerogeradores usam transmissões mecânicas por engrenagens com múltiplos andares entre a turbina e o gerador, pelo que, deste modo, parte da energia que a turbina recebe diretamente do vento é dissipada sob a forma de calor na transmissão mecânica. Devido às elevadíssimas potências de acionamento, um pequeno ganho de eficiência (0.5 a 1%), traduz-se num aumento da potência que chega ao gerador na ordem das dezenas, podendo-se atingir as centenas de kW. Considerando uma turbina eólica de 5 MW em funcionamento à potência nominal, um ganho de 0.5% na eficiência da transmissão mecânica corresponde a um aumento de 25 kW na potência útil que chega ao gerador.
Este exemplo comprova os ganhos diretos do aumento da eficiência do maquinismo, neste caso em particular da transmissão mecânica. É, portanto, fácil imaginar que qualquer máquina ou maquinismo que seja acionado por um sistema cujo movimento tem de ser convertido mecanicamente noutro, estará quase inevitavelmente sujeita a perdas de energia por atrito.
Efetivamente, estudos recentes demonstram que aproximadamente 23% de toda a energia produzida mundialmente é gasta com os fenómenos de atrito e desgaste em maquinismos [1]. Desta fatia, 20% são necessários para superar o atrito inerente ao funcionamento dos sistemas mecânicos e 3% são usados para a reparação, fabrico e substituição dos componentes desgastados/avariados [1]. Torna-se assim evidente a necessidade de otimizar as máquinas e maquinismos, com vista à fiabilidade e eficiência.
Otimizar lubrificação e geometria de forma integrada traduz-se em ganhos de eficiência
Conceber qualquer equipamento pensando na eficiência mecânica como uma variável de projeto fundamental, considerando conceitos de lubrificação e geometria otimizada de forma integrada, pode facilmente permitir ganhos de eficiência mecânica superiores a 1%. Isto, por sua vez, pode representar diminuições da energia dissipada na casa dos 40%, caso estejamos a falar de transmissões mecânicas por engrenagens [2], embora tal como foi referido anteriormente, estes conceitos se possam aplicar transversalmente a qualquer maquinismo.
Além do mais, a eficiência e a fiabilidade andam muitas das vezes de mãos dadas, uma vez que uma maior eficiência mecânica significa menor energia dissipada nos maquinismos. Isto, por sua vez, traduz-se numa redução das temperaturas nas superfícies de contacto nos órgãos mecânicos e, por conseguinte, numa diminuição da probabilidade de avaria nessas mesmas superfícies.
Em sistemas lubrificados, uma maior eficiência diminui ainda as temperaturas de funcionamento do lubrificante, podendo diminuir a sua taxa de oxidação ao longo do tempo, permitindo intervalos de manutenção potencialmente mais longos.
O acumular destes ganhos de eficiência
significa que o desenvolvimento e implementação de máquinas e maquinismos
eficientes e fiáveis tem, e terá nos próximos anos, um papel preponderante no
que à redução das emissões de CO2 diz respeito. Em termos concretos,
estima-se que o impacto de medidas neste sentido se possa traduzir, a longo
prazo (cerca de 15 anos), numa potencial diminuição das emissões de CO2na casa das 3140 Mt por ano [1]. Deste modo, os ganhos associados a sistemas
mecânicos eficientes vão muito para além de uma redução na fatura energética.
Referências
[1] - K. Holmberg, A. Erdemir, Influence of tribology on global energy consumption, costs and emissions. Friction 5, 263–284 (2017). https://doi.org/10.1007/s40544-017-0183-5
[2] - Carlos M.C.G. Fernandes, Pedro M.T. Marques, Ramiro C. Martins, Jorge H.O. Seabra, Gearbox power loss. Part II: Friction losses in gears, Tribology International, Volume 88, 2015, Pages 309-316, ISSN 0301-679X. https://doi.org/10.1016/j.triboint.2014.12.004