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Estruturas oceânicas e seus materiais: da madeira e do ferro, aos compósitos e materiais inteligentes

22 julho 2021

Artigo de Miguel Onofre Gomes, engenheiro de desenvolvimento de produto na área das tecnologias para o mar no INEGI.


O ambiente oceânico sempre colocou desafios significativos ao desempenho das estruturas e equipamentos que nele operam. Seja pela imprevisibilidade e carácter por vezes extremo das condições meteorológicas e oceanográficas, ou pelo efeito desse ambiente nas estruturas - através da corrosão e incrustação de micro-organismos, algas ou animais - a seleção de materiais adequados, com as propriedades mecânicas certas, tem um papel preponderante na engenharia oceânica.

O estudo dos materiais nesta área da engenharia tem, por isso, vindo a acompanhar e «emprestar» o conhecimento e desenvolvimentos de outras indústrias e áreas técnicas. Seja para fabrico de navios, equipamentos ou estruturas offshore, a seleção de materiais esteve sempre fortemente ligada tanto às técnicas de fabrico disponíveis como à disponibilidade dos recursos.

Uma ciência com séculos de história

A embarcação mais antiga que conhecemos, descoberta junto da grande pirâmide de Gizé e datada de cerca do ano 2500 a.C., foi construída com madeira de cedro1. Embora surjam, no decorrer da idade do Bronze, certos elementos menores fabricados com liga metálica e, mais tarde, reforços estruturais fabricados em ferro, a madeira manteve-se o material de eleição na construção naval até ao século XIX. Nesta altura, surge o ferro, disponível pela primeira vez na forma de placas de grandes dimensões, tendo assim substituído a madeira, permitindo o fabrico de navios de maiores dimensões.

Já na década de 1940, materiais como o aço (devido à sua elevada resistência mecânica) e o alumínio (devido ao peso reduzido) ganham popularidade. Mais tarde, devido ao crescimento da exploração de petróleo offshore nas décadas de 1960 a 1980, começaram a ser utilizados metais de alto desempenho para aplicações específicas, como o titânio e ligas de níquel.

Saltamos para os dias de hoje e observamos que os mais recentes desenvolvimentos ao nível da engenharia de materiais influenciam em igual medida a engenharia oceânica. Falamos de materiais como laminados compósitos, novas ligas metálicas e poliméricos de alto desempenho. Exemplo disso é a aplicação de compósitos, como a fibra de carbono, em equipamentos para desportos náuticos de alta competição, motivada pela procura da redução do seu peso.

Importa olhar para o relatório Global Marine Technology Trends 20302, que aponta para as áreas de transporte marítimo, defesa naval e espaço oceânico, 8 áreas tecnológicas nas quais o desenvolvimento científico terá maior impacto até ao final da presente década. O desenvolvimento de materiais avançados é indicado como uma tecnologia com impacto transversal às três áreas.

De acordo com este estudo, os materiais do futuro serão mais resistentes, mais duradouros e mais leves, permitirão a sensorização do ambiente envolvente e apresentarão capacidades de auto-limpeza e auto-reparação. Serão também inteligentes, e a sua integridade estrutural será avaliada através de sensores, remotamente.

Revestimentos bio-inspirados resultarão em superfícies com melhores características hidrodinâmicas, levando à redução do consumo de combustível por parte dos navios e consequente redução da emissão de gases de efeito de estufa. Alterações da estrutura dos metais à escala do nanómetro levarão à melhoria da resistência à corrosão.

Há novos materiais a nascer com contributo do INEGI

A visão apresentada nesta publicação ainda não se tornou realidade, mas o caminho está traçado e compete ao setor de I&D&Inovação trabalhar com vista à aplicação de novos materiais em ambiente oceânico.

Esta vocação para o oceano marca também a atuação do INEGI, cuja abordagem multidisciplinar se tem aprofundado, respondendo às exigências de um setor sedento por mudança e atualização tecnológica.

Exemplo disso é o recente trabalho desenvolvido com polioximetileno (POM), um termoplástico de elevado desempenho, alta rigidez e baixa densidade, atrito reduzido e muito boa resistência à corrosão. As propriedades mecânicas deste material foram caracterizadas experimentalmente nos laboratórios do INEGI, através de ensaios de tração e de impacto. O conhecimento resultante informou a elaboração de modelos matemáticos de comportamento mecânico, posteriormente utilizados no projeto de estruturas subaquáticas.

Graças ao contributo do INEGI, este material deu corpo, entre outros, a um observatório marinho para monitorização de algas invasoras, capaz de operar até profundidades de 200m3.4, e uma estação de docagem para veículos autónomos submarinos5.

Em 2021 abraçamos também o desafio de participar no projeto europeu MAREWIND, focado no desenvolvimento de novas soluções na área dos materiais, com vista à redução do custo e prolongamento do tempo de serviço dos equipamentos utilizados no sector da energia eólica offshore.

Vamos ajudar a criar novas formulações de betão específicas para ambientes oceânicos, materiais compósitos, revestimentos para proteção dos materiais contra a corrosão e incrustação de material biológico, entre outros aspetos que se espera virem a contribuir para a competitividade desta forma de energia renovável. Estes aspetos serão ainda testados em ambiente real, com a instalação de estruturas devidamente sensorizadas e monitorizadas, de forma a registar e estudar o comportamento dos materiais neste ambiente.

De que materiais serão feitas as estruturas oceânicas do futuro? O INEGI está a trabalhar para oferecer possíveis soluções. Tirando proveito de um largo espetro de conhecimento na área da engenharia, ajudamos a desenvolver novos materiais com propriedades excecionais para modernizar as atividades marítimas.


Referências

[1] United States Naval Academy, "EN380 Naval Materials Science and Engineering Course Notes”.

[2] Lloyd’s Register, QinetiQ, University of Southampton, "Global Marine Technology Trends 2030”, 2015, ISBN: 978-0-9933720-1-8.

[3] F. Assis Gonçalves, M. Onofre Gomes, N. Mathias, T. Morais, and T. Ferradosa, "Numerical modelling of full-scale subsea lander AMALIA with in-situ conditions,” Proceedings of the Institution of Civil Engineers - Maritime Engineering, pp. 1–32, Mar. 2020.

[4] Algae-to-Market Lab Ideas

[5] INTENDU

[6] MAREWIND

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